Um dos limites ao narcisismo é a reprodução
sexuada. Por mais que sejamos egocêntricos, nunca poderemos transmitir todos os
nossos genes a nossos filhos. A reprodução sexuada exige um(a) parceiro(a)disposto(a)
a contribuir com 50% dos genes. As formigas da espécie Cataglyphis cursor são
capazes de clonar a si mesmas. O processo que as liberou da tirania da
reprodução sexuada recebeu o nome de thelytokia.
Como nós, as formigas-rainha
possuem duas cópias de cada gene (são diploides). As células reprodutivas
passam por um tipo especial de divisão celular que resulta em células com uma
cópia de cada gene (são haploides). No caso dos humanos, estas células são os
óvulos e os espermatozoides. Na fecundação, um óvulo se funde a um espermatozoide e os(as)
filhos(as) possuem duas cópias de cada gene, um do pai, outro da mãe (são
novamente diploides).
Na maioria das formigas, as rainhas copulam uma única vez
e estocam os espermatozoides. Só então começam a produzir seus óvulos. Os óvulos
são produzidos aos pares ,cada um com uma das cópias dos genes. O controle da
rainha sobre sua reprodução é enorme. Quando um óvulo é produzido, ela “decide”
se libera um espermatozoide. Caso o libere, o óvulo é fecundado, produzindo uma
fêmea diploide. Caso seja alimentada normalmente, esta fêmea se transforma em
uma trabalhadora, incapaz de reproduzir. Se a rainha não liberar espermatozoides,
o óvulo se transforma em um macho haploide, com somente uma das cópias dos
genes da mãe.
Para produzir novas rainhas, a maioria das formigas alimenta as fêmeas
jovens com geleia real, o que as transforma em rainhas férteis. Geradas por
reprodução sexuada, com 50% dos genes vindos do óvulo e 50% do espermatozoide,
as rainhas-filhas são diferentes de suas mães.
Tudo ia bem no reino das Cataglyphis
até que cientistas resolveram aplicar nas rainhas filhas um teste de
paternidade semelhante ao que a Justiça humana utiliza para determinar quem é o
pai de uma criança. Descobriram que todas as rainhas-filhas eram idênticas às
mães, possuindo somente os genes da mãe. Não tinham pais; eram “clones” de suas
mães.
Com um pouco mais de investigação, descobriram o truque utilizado pelas
Cataglyphis. Em determinadas situações, as rainhas liberam simultaneamente dois
óvulos contendo, cada um, 50% dos genes da rainha. Em fez de liberar espermatozoides
para fecundar os óvulos, a rainha utiliza um mecanismo ainda desconhecido para
fazer com que os dois óvulos se fundam, produzindo uma célula diploide com
todos os genes da mãe. É como se ela cortasse uma maçã ao meio para imediatamente
depois juntar as metades. É a thelytokia. Estas células se desenvolvem em rainhas-filhas
que são clones da rainha-mãe. As egocêntricas rainhas Cataglyphis não só
controlam o sexo dos filhos, mas se dão ao luxo de só utilizarem a reprodução
sexuada quando “querem”.
Descoberto o primeiro exemplo, os cientistas, detestes
de paternidade em punho, estão tentando descobrir o fenômeno em outras espécies.
Mais detalhes em Conditional
use of sex and parthenogenesis for worker and queen production in ants.Science,
vol. 306, page. 1780, 2004.
Postado por Glauciléia Brito
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